Existem três poderes no Brasil: Executivo, Legislativo e Judiciário. Todos eles operam dentro de limites constitucionais, equilibrando-se através do Sistema de Freios e Contrapesos. Se apenas um deles extrapolar os seus limites de atuação, toda a República fica ameaçada.
É o que parece estar acontecendo no Brasil atual, e da pior forma possível, visto que o desequilíbrio está partindo do poder Judiciário, precisamente do Supremo Tribunal Federal, órgão responsável por garantir, com o máximo de fidelidade, o cumprimento da Constituição Nacional, o documento que é nada menos do que a espinha dorsal do Estado Brasileiro.
Não nos deteremos a decisões passadas, nem ao escandaloso inquérito ilegal que tramita na Corte. Qualquer cidadão bem informado da atuação dos ministros do STF nos últimos anos já tem consciência de que não é de hoje que alguns dos magistrados estão abusando do próprio poder.
A provável decisão majoritária pela reeleição de Rodrigo Maia – presidente da Câmara dos Deputados – e Davi Alcolumbre – presidente do Senado Federal – é o caso em voga, o exemplo cabal de que neste país a Constituição Federal tem sido moldada à revelia de certos interesses, e não aplicada literalmente, como deve ser.
Conrado Hübner, professor de Direito Constitucional da USP, comentou a respeito: “Ministros concluirão que a Constituição não diz o que diz. Tentarão nos convencer que, num escaninho do texto a que eles têm acesso exclusivo, a Constituição quis expressar o contrário. É fraude, não argumento”, afirmou o docente em artigo para a Folha de S. Paulo.
O motivo é simples: a Constituição proíbe CLARAMENTE a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado, conforme o Artigo 57, § 4º, que diz:
“Cada uma das Casas [Câmara e Senado] reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de dois anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente.”
Como podemos ver, não se trata de um texto dúbio, onde a divergência de interpretações poderia existir. O trecho diz que a recondução (ou eleição) é “vedada” para o “mesmo cargo” em se tratando de eleição “subsequente”, ou seja, de alguém que tenha a intenção de concorrer, mesmo já estando no cargo.
Insegurança judicial
Diante da possibilidade do STF “reinterpretar” o trecho acima, a fim de autorizar a reeleição de Maia e Alcolumbre, nos resta perguntar: qual é a segurança jurídica que ainda resta no Brasil? Se confirmada a decisão, a resposta é: nenhuma!
Se o STF formar maioria pela reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado, a Corte estará dizendo ao povo brasileiro que a nossa Carta Magna não é confiável naquilo que diz. Que ela depende da “iluminação” dos magistrados para que possa ser interpretada e aplicada, logicamente da forma como eles mesmos entendem.
Na prática, será o fim da segurança judicial no Brasil, visto que isso caracterizará a presença não de juízes, pretores da Constituição no Supremo, mas de militantes que usam o poder da magistratura para aplicar medidas que atendam aos próprios interesses, de grupos ou pessoas. Não por acaso o Senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirmou:
“Golpe em andamento! Gilmar, Toffoli e Kassio escolheram as sombras da madrugada para manifestar seus votos em favor do golpe contra a Constituição para permitir a reeleição de Maia e Alcolumbre. Até para os parâmetros brasileiros impressiona o casuísmo cínico dos ministros.”
A deputada Bia Kicis, que também é procuradora, afirmou: “Ministros do STF negam-se a atuar dentro dos limites de sua honrosa atribuição constitucional; querem legislar, alterar a Constituição com seus malabarismos mentais. Decisão contra texto expresso da CF será inconstitucional, o Parlamento precisa rejeitar!”.
Diante desse cenário, se não houver uma reação legal do Senado e da Câmara contra o possível abuso do STF, não restará nada aos brasileiros, senão entregar de uma vez por todas às chaves do Brasil nas mãos dos 11 togados.