O Brasil vem atravessando um momento delicado, talvez o mais grave em termos institucionais desde à promulgação da Constituição Federal de 1988. Nunca se viu, desde então, tantos abusos de direitos fundamentais em nome da “justiça”, da “ciência” e da “democracia”. Termos que, na verdade, não traduzem suas reais essências, mas apenas os interesses de quem os utiliza por conveniência própria.
No meio disso tudo, uma figura não tem como ser esquecida: o ex-juiz Sérgio Moro, ícone da Operação Lava Jato e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do atual governo, o qual resolveu renunciar ao seu cargo de forma súbita no meio de uma crise sanitária mundial, em 24 de abril de 2020.
O propósito desse texto não é entrar no mérito da renúncia feita por Moro, pois disso já tratamos em outras ocasiões e concluímos que ela foi injustificável, espalhafatosa, vaidosa e oportunista, o que acabou se convertendo em um tremendo tiro no pé do próprio ex-ministro e em uma mancha irreparável na sua tão valiosa biografia.
Neste texto, o objetivo é apontar o quanto o silêncio de Sérgio Moro diante do atual cenário do país é revelador. Silêncio esse que diz respeito a algumas prisões e mandados de busca e apreensão que vêm ocorrendo no país desde 2020, bem como as cenas de terror protagonizadas por senadores na CPI da Pandemia ao destratar profissionais de saúde, mulheres e outros, de forma claramente enviesada para fins políticos e não de saúde.
Além disso, o silêncio também sobre a mais recente postura de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da PEC do voto impresso, a decisão de suspender a monetização de perfis que apoiam o governo nas redes sociais e abrir inquérito contra alguns organizadores da manifestação no dia 7 de setembro.
Um reflexo de interesses e caráter
Desde que deixou o governo, quando provavelmente percebeu que a sua decisão não resultou em captação política, mas pelo contrário, terminou despertando em boa parte dos antigos apoiadores a raiva, desconfiança e repúdio, Sérgio Moro passou a ser uma pessoa ainda mais reservada, se voltando para a sua carreira no setor privado.
Inicialmente não foi assim, mas o tempo e as constantes críticas sobre alguns comentários que fazia, parecem ter feito ele perceber que a sua expectativa de aceitação popular estava, na verdade, produzindo efeitos contrários. Daí veio a aparente mudança de postura no que diz respeito aos assuntos públicos.
O ex-ministro, como até hoje, resolveu se concentrar mais em temas genéricos e de ampla aceitação, como o combate à corrupção, o que lhe deixou famoso durante a Operação Lava Jato. O mesmo pode-se dizer a respeito do combate à pandemia. Nada, porém, sem qualquer grande avaliação de mérito sobre os acontecimentos mais polêmicos paralelos aos demais.
Percebemos claramente essa diferença, por exemplo, quando comparamos Moro com a também jurista Janaína Paschoal, que por sinal é uma grande entusiasta do ex-juiz. A deputada, por outro lado, nunca deixou de se posicionar sobre os fatos mais polêmicos, mesmo tecendo críticas e elogios ao presidente Jair Bolsonaro. STF, CPI, manifestações, pandemia, o governo, nada deixou de ser pautado por Janaína ao longo desse tempo.
Já Moro, por outro lado, parece fazer questão de “filtrar” alguns temas, ou no mínimo ser bastante genérico e evasivo ao abordá-los, e isso é o que nos chama bastante atenção, pois a questão é: esse é o tipo de postura que se espera de um possível candidato à presidência da República? De um homem que tem o suposto potencial de ser o líder de uma das maiores democracias do planeta?
A resposta ao nosso questionamento é: definitivamente, não! Isso porque, entendemos que é justamente no momento de crise onde os grandes líderes se destacam, e qualquer pessoa capaz de presidir um país deve ser um grande líder. É na tensão, no meio da confusão onde muitas vezes o caos parece imperar que um líder aparece.
No caso de Sérgio Moro ocorreu e ainda ocorre justamente o contrário. Em vez de aparecer, ele desapareceu. Em um momento onde o STF está no olho do furacão, o que pensa o homem que chegou a ser cotado para ocupar uma vaga na corte? Que ocupou a cadeira de ministro da Justiça e se tornou uma referência no combate à corrupção? Não sabemos, porque ele não aborda tais assuntos. Ao menos não de forma explícita.
Quando cidadãos têm suas liberdades prejudicadas e direitos violados, o que pensa a esse respeito o grande Sérgio Moro? Ou será que inúmeros juristas, incluindo um dos maiores do mundo, como o Dr. Ives Gandra Martins, estão errados ao concordar que há no país um cenário de interferência do poder Judiciário nos demais Poderes? O que pensa sobre isso o ex-juiz da Lava Jato? Não sabemos.
Entretanto, já diz o ditado popular que “quem cala, consente”. Sendo assim, é provável que Moro concorde com o que para nós são abusos de autoridade praticados por ministros do STF ou senadores da CPI da Pandemia? Sim, é provável. A falta de manifestação contundente contrária da sua parte nos permite cogitar isso, o que torna a imagem do ex-juiz muito pior aos nossos olhos, porque isso nos leva a pensar: quais são os seus reais interesses?
É possível que a aparente omissão pública de Moro em relação ao cenário de abusos judiciais ocorridos no país seja o reflexo de interesses pessoais escusos. Mas também é possível que seja apenas o reflexo de um caráter, agora, acovardado pela sucessão de pequenas derrotas no campo da opinião pública e até no Judiciário. Difícil saber o que é pior para um homem que tinha tudo para ter um destino bem diferente.