Qual é a principal narrativa da grande mídia e políticos como o governador João Doria, quando falam sobre a necessidade de isolamento social diante da pandemia do novo coronavírus? A importância de se evitar um “colapso na saúde” por causa de uma demanda excessiva de atendimentos ao mesmo tempo, certo?
Mas, essa é uma possibilidade fruto da pandemia atual, ou se trata de uma realidade que antecede o coronavírus e já fazia parte do cotidiano das populações mais pobres do Brasil, dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS)?
O surgimento do novo coronavírus é um agravante para a rede pública de saúde, não temos dúvida alguma disso, mas está longe de ser a causa primária de um colapso no sistema, isto por um motivo simples: o colapso sempre existiu!
Qualquer dependente do SUS que neste exato momento está há semanas, meses e até anos esperando uma vaga para conseguir uma simples consulta médica, exames ou cirurgias, sabe que o colapso da saúde pública antecede a qualquer pandemia.
Os problemas são velhos conhecidos: corredores lotados, filas intermináveis, cidadãos madrugando nas ruas para conseguir “senhas” para atendimento, falta de medicamentos, equipamentos e profissionais, atrasos, insalubridade, humilhação e desumanização. Esqueci alguma coisa?
Leitos vazios
Se os atuais prefeitos e governadores estivessem, de fato, preocupados com a saúde pública, estariam falando em “colapso da saúde” muito antes da pandemia chegar no Brasil.
Em um dos maiores hospitais da América Latina, o Hospital da Restauração, em Recife, Pernambuco, estado onde o isolamento é um dos mais acirrados sob o comando do governador socialista Paulo Câmara (PSB-PE), a situação já era de colapso diário há anos.
Os corredores (foto de capa) da Restauração é conhecido na região, entre os mais humildes, como um verdadeiro “abatedouro” devido à quantidade de pacientes que ficam amontoados uns sobre os outros em macas, chão e onde tiver espaço, aguardando atendimento.
A dura verdade é que a pandemia do novo coronavírus parece estar servindo, também, para drenar recursos públicos para os estados e municípios, mas sem dúvida agravando uma situação pré-existente de caos na saúde pública.
Com a justificativa de construir hospitais de campanha e comprar respiradores ao preço de pequenas fortunas – muitos vindos da China -, políticos estão surfando na “onda corona” para fazer compras sem licitação e instaurar o que parecem mais experimentos ditatoriais do que combate à propagação do vírus.
Hospitais de campanha
Outra medida adotada largamente e que exigiu grandes somas de recursos foi a construção dos hospitais de campanha. Pergunta ao leitor: quantos estão funcionando, cheios ou pelo menos com um terço da capacidade ocupado?
No Ceará, a notícia é de que o Ministério Público pediu na segunda-feira (18) explicações à Secretaria de Saúde local sobre o desmonte de um desses hospitais, observe:
“Segundo a denúncia recebida pela Promotoria, foi construído um hospital de campanha vizinho ao anexo do Hospital Infantil Albert Sabin, no bairro Vila União, que teria tido sua estrutura desmontada no sábado (16/05/20), sem que o equipamento tenha sido usado, acarretando desnecessário investimento de recursos públicos.”
No Rio de Janeiro, outro hospital de campanha que deveria ter sido inaugurado no domingo (17) nem mesmo ficou pronto, ou seja, NÃO FUNCIONA!
“O hospital foi construído no Clube Mauá, no bairro Estrela do Norte, próximo ao Centro do município. No local, funcionava uma escolinha de futebol. A ideia é que a unidade tenha 200 leitos, sendo 40 de UTI”, informou o G1.
O que isto significa, na prática?
Estamos diante de um cenário de profunda hipocrisia, oportunismo e politização do sofrimento alheio.
Ninguém em sã consciência pode negar a existência de uma pandemia e os riscos envolvidos no contágio com o novo coronavírus, sua gravidade e os milhares de mortos, mas parece evidente que esta doença também tem servido como ferramenta de exploração política, econômica e social.
O colapso da rede pública de saúde sempre existiu e não vimos mobilização para resolvê-lo de forma efetiva. Não vimos o interesse das autoridades em destinar bilhões para sanar os corredores lotados de pacientes nos hospitais públicos, adquirir equipamentos médicos e construir mais unidades de atendimento nos milhares de territórios carentes desse país.
A pandemia, por fim, salvo a sua real necessidade de atenção, proporcional para cada região, lamentavelmente também tem sido um instrumento de mentiras, manipulação e exploração da população. A pergunta que fica é: até quando?